Restaurante Selva do Lena - Leiria

Nesta selva reinam o cabrito, o pato e até o robalo

O que começou por ser uma casa simples e discreta, embrenhada no meio do matagal nos arredores de Leiria, é hoje uma referência gastronómica e ao mesmo tempo um dos segredos mais bem guardados da região. O Hard Rock Cafe decorou-lhe as paredes com relíquias da música mas o que trouxe fama (e proveito) a este restaurante foram os tesouros culinários da D. Henriqueta. Fome de leão? Há 35 anos que o Selva do Lena trata do assunto com petiscos e pitéus tradicionais.

Trocar a agitação de New Jersey e os jogos de bilhar com Clint Eastwood pelo inóspito lugar de Mourã, no concelho de Leiria, é como mudar do dia para a noite mas João de Sousa Antunes, imigrante nos Estados Unidos durante longos anos, jurou regressar à terra natal para abrir um restaurante. Quando voltou, no final dos anos 70 do século passado, encontrou um terreno selvagem e cheio de mato, próximo do rio Lena, onde nem sequer havia luz, água ou saneamento básico. Longe de tudo e de todos (ainda hoje é um pouco assim) a casa acabou batizada com o nome Selva do Lena.

Mas as curiosidades à volta desta vivenda não ficam por aqui e revelam-se logo à chegada. Por exemplo, o que faz uma placa original do Hard Rock Cafe junto à entrada? O restaurante, inaugurado em fevereiro de 1980, foi durante muitos anos o único representante em Portugal da famosa cadeia norte-americana, graças às amizades que João de Sousa Antunes fez nos Estados Unidos. São desse tempo algumas das preciosidades que emolduram as paredes mas, por enquanto, ainda não as revelamos. Primeiro, vamos conhecer os cantos à casa.

Decoração clássica com uns toques de rock

O nome do restaurante e os animais selvagens (em pedra) que espreitam na fachada até podem sugerir uma decoração excêntrica mas lá dentro reina a sobriedade e o mobiliário clássico. Quem chega é recebido numa sala de espera (os 65 lugares da casa são poucos para tanta procura), aquecida por uma lareira que torna o ambiente ainda mais acolhedor, enquanto as cadeiras e as mesas em vime emprestam um certo ar castiço e descontraído a esta zona.

Ali ao lado fica a sala de refeições, mais espaçosa e mais elegante, onde sobressaem os grandes candelabros e o ocre dos ladrilhos que revestem boa parte das paredes. Estas são emolduradas por apontamentos históricos mas discretos, como fotos a preto e branco de Leiria, um louceiro com pratos antigos ou um faqueiro do tempo dos reis. Mais imponente é um armário em madeira maciça cuja origem perdeu-se no tempo (foi comprado num antiquário) embora aparente ter longos séculos de vida.

Mas é claro que também não podia faltar um cantinho com as relíquias oferecidas pelo Hard Rock Cafe. A maioria está guardada em local seguro mas algumas continuaram expostas para comprovar a antiga ligação do Selva do Lena ao grupo norte-americano. São os casos de uma coleção de bilhetes de concertos dos Beatles ou do disco de ouro que o grupo 10cc recebeu com o sucesso I am Not In Love. E o que faz uma foto de Clint Eastwood junto a estas molduras? Henriqueta Machado, proprietária do restaurante desde que o marido faleceu, garante que ele conheceu o ator e que até se encontraram várias vezes para jogar bilhar.

Sabores à moda antiga

A história, as recordações e o serviço atencioso trouxeram um carisma especial ao Selva do Lena mas a longevidade deste clássico deve-se, mais do que tudo, à gastronomia. Há 35 anos que dá a provar o melhor da cozinha tradicional portuguesa, sempre em doses generosas. Há algum tempo que a D. Henriqueta delegou a confeção dos pratos à cozinheira Fernanda Rato (encarrega-se agora da coordenação da cozinha e do atendimento aos clientes) mas aquele gostinho a “comida da avó”, cada vez mais difícil de encontrar, manteve-se um dos trunfos da casa.

Isso comprova-se logo nas entradas, como as pataniscas de bacalhau ou a salada de polvo, e acentua-se nos pratos principais. Entre as carnes, destacam-se por exemplo, o cabrito à Selva, o bife à casa, o arroz de pato e o arroz de cabidela, enquanto nos peixes vale a pena provar a massa de robalo ou o linguado frito com arroz de grelos. Os adeptos dos grelhados no carvão também vão gostar de saber que há uma grande variedade de peixe fresco (diário), orgulhosamente exibido numa montra junto à cozinha.

Muitas das sobremesas ainda têm a mão da D. Henriqueta, caso do bolo de bolacha com recheio de noz ou da mousse de chocolate caseira, mas também há outras confecionadas por pasteleiros locais, como acontece com as Brisas do Lis, doce regional à base de ovos, açúcar e amêndoa muito apreciado pelos mais gulosos. Quanto à carta de vinhos e espumantes, conta com cerca 50 referências exclusivamente portuguesas.

Os paladares nacionais são, de resto, um ponto de honra para este clássico da restauração leiriense, habitat natural para pratos em vias de extinção e outras tradições gastronómicas. Nesta selva pouco importa a cadeia alimentar. Aqui impera mesmo a lei do mais saboroso. 

Nelson Jerónimo Rodrigues 2015-01-27

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