Restaurante Lisboète

Requinte francês com sabores portugueses

O francês Walter Blazevic mudou-se de armas e bagagens para o bairro de Santos, em Lisboa, e promete torná-lo no novo ponto de encontro entre as cozinhas gaulesa e lusa. Desta cimeira gastronómica nasceu uma ementa criativa e surpreendente capaz de combinar foie gras e vinho do Porto, bacalhau e trufas, chá de jasmim e pera rocha. Enchanté!, diz o chefe aos produtos portugueses.

O que leva um chefe francês a trocar a alta gastronomia na Suíça por um pequeno restaurante em Portugal? Um caso de amor, pois claro. Ou melhor, dois. Primeiro por Mariana Monte, a companheira que conheceu em Genebra, e mais tarde pela vila de Óbidos, onde abriu em 1998 a primeira casa por conta própria, O Barco. Quase 16 depois anos, e após passagens pelas Caldas da Rainha e Portimão, este alsaciano está de volta à ribalta graças ao Lisboète, o novo restaurante de Santos que ocupa o antigo Alma de Henrique Sá Pessoa. 

À primeira vista pouco ou nada parece ter mudado no nº 92 da Calçada Marquês Abrantes (o mobiliário e a decoração mantêm-se) mas no que mais importa – a comida – há muitas e agradáveis surpresas. Walter Blazevic não foi atrás de modas e manteve-se fiel ao que o distingue dos demais: um equilíbrio quase perfeito entre a técnica da cozinha francesa, aprendida no país natal, e a autenticidade dos sabores portugueses, descoberta ao longo dos muitos anos que leva no nosso país. Também por isso o nome Lisboète faz todo o sentido.

Espaço minimalista, experiência total


Um galo em cerâmica junto à entrada (animal que tanto é símbolo nacional francês como ícone de Portugal) serve de anfitrião ao Lisboète e ao mesmo tempo de novidade em relação ao Alma. Já a sala de refeições, com capacidade para 36 pessoas, continua praticamente igual, dominada pelo branco dos tetos, paredes, cadeiras e atoalhados. O resultado é um ambiente minimalista e sofisticado, sem floreados ou extravagâncias.  

Uma luz ténue sobressai entre círculos dispersos e sem ordem aparente enquanto a maior claridade entra através da única janela, emoldurada no interior por um curioso jogo de espelhos. No outro extremo da sala existe um pequeno vidro que revela o corrupio da cozinha, também ela herdada de Henrique Sá Pessoa. São poucos os que resistem a espreitar lá para dentro mas os mais curiosos podem pedir para entrar porque o chefe irá recebê-los de braços abertos. A experiência vale bem a pena, quanto mais não seja para vermos a frescura dos produtos e observarmos o crepitar da comida que daqui a nada estará à nossa frente.

Da Alsácia ao Alentejo

O chefe pode ser francês (com ascendência italo-croata) mas a carta tem como base os (melhores) produtos portugueses, subtilmente combinados com outros mais internacionais. Assim acontece desde logo nas entradas, seja no salmão confitado em flor de sal, abacate e wasabi, na terrina de foie gras, sablé de especiarias, figos e vinho do Porto ou no aveludado de alho francês com lascas de bacalhau e emulsão de trufas. Nós experimentámos esta última e só de a recordarmos já ficámos de água na boca. 

Nos peixes destacam-se o atum mit-cuit (semi-cozinhado), cannelone de beringela, tomate e emulsão de ratatouille ou a corvina com funcho gratinado e jus corsé, enquanto nas carnes vale a pena provar o porco bísaro com migas de tomate, chouriço e espargos verdes ou o duo de borrego, azeitonas, alho, pastinaga (um legume) e tâmaras. E assim se prova que até as técnicas e empratamentos sofisticados casam bem com os mais tradicionais produtos alentejanos.

Para sobremesa também não falta uma seleção de queijos portugueses mas os mais gulosos vão preferir a tarte tatin com gelado de baunilha, o creme brulée de baunilha ou o pudim de chá de jasmim, pêra rocha confitada e seu financier (bolinho francês). Notas finais para a carta de vinhos com cerca de 30 referências (exclusivamente nacionais; algumas servidas a copo) e, claro, para a conta final, a rondar os 30/35 euros. Preço de cozinha de autor a fazer jus à arte de Walter Blazevic, o tal francês que se apaixonou por Portugal. A julgar pelo Lisboète, o amor será recíproco. 

Nelson Jerónimo Rodrigues 01-10-2014

Receba as melhores oportunidades no seu e-mail
Registe-se agora