Restaurante Kook Chiado

Diplomacia gastronómica 

Portugal, Japão e Angola reúnem-se à volta da mesa nesta  casa lisboeta que dá a provar vários tipos de cozinha no mesmo espaço. De terça a sábado, num recanto do Chiado, há uma cimeira de continentes e de sabores que faz jus ao melhor da globalização gastronómica. No Kook, o mundo é um restaurante.

Quantas vezes já combinou jantar com um grupo de amigos (ou com a sua cara-metade) mas não se entenderam sobre o tipo de comida? Petiscos, diz um, sushi responde o outro, algo exótico ou diferente, pedem mais dois ou três. Se gosta de consensos, desde agosto de 2014 que há um restaurante com tudo para agradar a gregos e a troianos: o Kook.

Situado na rua Vítor Cordon (liga o Chiado à Baixa pelo eléctrico 28) é a versão portuguesa de um dos mais afamados restaurantes de Luanda, batizado com o mesmo nome. O sucesso angolano sugeriu outros voos e Portugal tornou-se a rampa de lançamento para uma aposta na internacionalização com possível escala em várias cidades da lusofonia. Antes do salto para outro continente (já se fala de São Paulo, no Brasil) Lisboa vai servindo de barómetro ao grupo e, a contar pelo sucesso dos primeiros meses, mais cedo ou mais tarde o Kook vai mesmo ficar nas bocas do mundo.

Uma mesa com vista para três continentes

Por fora, o restaurante até passa algo despercebido mas lá dentro não deixa ninguém indiferente, sobretudo pelo ambiente acolhedor e descontraído que transmite logo à primeira impressão. Jovens, menos jovens, turistas, executivos, foodies e outras tribos misturam-se sem preconceitos num espaço pequeno (45 lugares), dividido entre bar (à entrada), sala de refeições e cozinha.

A pedra antiga, os arcos pombalinos e os azulejos do bar não escondem a idade do edifício (nem o ADN bem português) mas a remodelação do espaço conseguiu um bom compromisso entre o passado secular deste res do chão e a nova vida que o Kook lhe trouxe. O mesmo acontece com o mobiliário, num curioso jogo de épocas entre as mesas retro com tampo de mármore e os bancos e armários mais contemporâneos revestidos a madeira prensada. Já a (escassa) decoração prefere o pragmatismo: espelhos que oferecem mais profundidade à sala, candeeiros que aproveitaram caixas de vinhos, uma ardósia que chama a atenção para os pratos do dia. Neste restaurante o foco é mesmo a gastronomia.

O protagonismo da comida começa bem cedo graças a uma janela sempre aberta que desafia os clientes a espreitarem a cozinha e a descobrirem o seu funcionamento. Lá dentro o chefe principal (David Costa), o sushiman (Luís Otávio) e a chefe pasteleira (Jessica Carreira) compõem uma orquestra bem afinada que dá gosto ver e ouvir. Mas aqui os clientes não são meros espetadores e a proximidade é mais do que física. Quer fazer uma pergunta, tirar uma dúvida ou fazer um elogio para o lado de lá? Esteja à vontade, porque a descontração e a informalidade estão entre os pratos fortes da casa.

Quando tradição rima com fusão

Desengane-se quem pensar que o Kook é um restaurante de cozinha africana. As origens do grupo influenciaram o conceito da casa mas não propriamente a ementa. Mesmo assim não faltam dois embaixadores angolanos – as icónicas muamba e cerveja Cuca -  para matar as saudades de uns e a curiosidade de outros. Mais novidades poderão estar a caminho mas, pelo menos para já, são os petiscos portugueses e o sushi de fusão que têm honras de destaque. Uma dupla improvável que já sentou à mesma mesa muitos clientes de “religiões” gastronómicas opostas.

A ementa está carregada de “k”, do krispy batata doce e prego no kako  ao bakalhau à Brás e kataplana de peixe e marisco, passado pelo bitoke de carne maturada (com marmelo e castanha) e pelo kozido (à portuguesa) do Kook. Este último prato é um dos ex-libris da casa mas o chefe David Costa tem outras razões de orgulho, casos do húmus de tremoço (entrada), do pika aqui pika ali (uma espécie de pica pau com molho agridoce) ou o rabo de boi estufado e desfiado, artisticamente rodeado por legumes de três cores. Para acompanhar há cerca de 35 referências de vinhos, com preços desde os 3,5€ (a copo) aos 490€ de um ilustre Barca Velha 1985.

Tão ou mais variada que a carta de pratos e petiscos, a lista de sushi e sashimi também tem muito por onde optar, com a vantagem de poder agradar tanto a novatos como a experts na matéria. Entradas (sopa ou kimuchi, por exemplo), temakis, kombinados, uramaki, gunkan, niguiris, hossomaki e até hot rolls (caso do rolo de salmão e peixe picado com molho picante) nascem das mãos do sushiman Luís Otávio como se fossem pequenas peças de arte. E em nada rivalizam com os pestiscos portugueses. Antes pelos contrário, até sugerem uma inesperada conjugação de sabores.

Por fim vale a pena guardar um cantinho no estômago para, pelo menos, uma sobremesa da chefe Jéssica Carreira. Nós experimentámos o arroz doce e não nos arrependemos. Não só pelo sabor mas também pela inesperada apresentação e combinações propostas. Afinal não é todos os dias que o arroz doce de côco surge como recheio de uma massa frita e logo acompanhado com espuma de maracujá e gelado de moijto. Mas afinal o Kook é isto mesmo: desconstrução de sabores (e não destruição), irreverência e universalidade. De Angola a Portugal, com passagem por Lisboa e outras paragens distantes, há muitos mundos por descobrir ao virar daquela esquina lisboeta.  

Nelson Jerónimo Rodrigues 2014-12-17

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