Passeio em Belver e Gavião

Da sombra do castelo ao fresco do rio

Separadas pelo Tejo mas unidas pelo Homem, a aldeia de Belver e a vila do Gavião compõem o único concelho alentejano com um pé nos dois lados do rio. Um território de transição, repleto de história e beleza natural, que desafia os visitantes a subirem e descerem colinas, entre miradouros, ruas tranquilas e casas pintadas de branco. Venha daí conhecer um Alentejo diferente, d`aquém e d`além Tejo. 

Apenas meia dúzia de quilómetros separam Belver do Gavião mas as duas localidades nem sempre estiveram tão próximas como agora. A primeira chegou a ser “independente” durante mais de três séculos (de 1518 a 1836) e ainda fez parte de Mação até que, em 1898, passou a pertencer ao concelho de Gavião, prolongando-o para a margem norte do Tejo. 

Cada uma tem o seu encanto mas é a mais pequena - Belver - que guarda um património maior por isso iniciemos por lá este passeio. A Praça 5 de Outubro é um bom local para estacionar o carro e partir à descoberta, começando logo pelo principal ex-líbris do concelho: o castelo de Belver. Situado no alto de uma encosta com mais de 230 metros (prepare-se para subir a íngreme escadaria) começou a ser construído no século XIII pela Ordem dos Hospitalários e o nome (Belver) foi imposto pelo próprio rei D. Sancho I. Quando chegar lá acima irá perceber porquê.

As vistas do castelo, com a aldeia aos pés e o Tejo como pano de fundo, são realmente arrebatadoras e dão a conhecer um outro Alentejo, em que o casario branco se dissolve entre colinas verdes e altivas. Os olhos prendem-se facilmente no horizonte mas no interior das muralhas também vale a pena admirar a torre de menagem e a capela quinhentista de São Brás com o seu belo retábulo. Guerra e fé, lado a lado, sempre indissociáveis na história de Belver.

Sabores alentejanos, bolas de sabão e trilhos isolados

De regresso à Praça 5 de Outubro vale a pena visitar a Igreja Matriz, fundada no século XVI, e deambular um pouco pelas ruas estreitas e tranquilas da aldeia. Caminhando no sentido do rio há de encontrar o miradouro do Outeirinho, com vistas semelhantes às do alto do castelo mas mais próximas do Tejo. Não muito longe (na estrada nacional, sentido da ponte) fica um dos mais afamados restaurantes do concelho, o Sabores de Guidintesta, inspirado no nome que a região entre o Zêzere e o Tejo tinha no início da nacionalidade. Quanto à carta, privilegia as especialidades alentejanas, como as migas e açordas, o ensopado de borrego ou as plumas de porco preto.

Saciado o estômago, nada melhor que fazer a digestão com um passeio a pé até ao Museu do Sabão, a um par de quilómetros dali. Situado na antiga escola primária de Belver, dá a conhecer a história deste produto com especial destaque para os tempos em que o rei mandou instalar na localidade a Real Fábrica do Sabão. Uma revolta de saboeiros (em 1858) contra o monopólio régio retirou-lhe importância mas as gentes da terra continuaram a produzir sabão em casa até meados do século passado.

A visita à aldeia de Belver fica completa depois de uma espreitadela à capela seiscentista de Nossa Senhora do Pilar (a dois quilómetro do museu, sempre a subir) mas a freguesia tem muito mais para ver. Os adeptos do pedestrianismo poderão descobri-lo com o Percurso Arribas do Tejo, uma rota circular por caminhos rurais que liga as duas margens do rio e passa por locais mais isolados, como a Anta do Penedo Gordo ou a Fonte Velha. Para percorrer os 15 quilómetros de distância seriam necessárias quatro a cinco horas de caminhada por isso decidimos voltar ao carro e seguir sem mais demoras para o Gavião.

Este Tejo dava um poema

Por estrada, o caminho mais rápido até à sede de concelho é atravessando a ponte sobre o Tejo mas também é possível chegar à outra margem através do paredão da barragem de Belver, com passagem pela povoação de Torre Fundeira e pela Praia Fluvial da Ortiga. Mesmo assim, chega-se lá em menos de 45 minutos e, verdade seja dita, bastam outros tantos para conhecer o centro da localidade.

Neste caso estacione o carro no Largo do Município, onde ficam os principais pontos de interesse do Gavião, como a Igreja Matriz (fundada no século XVII e consagrada a Nossa Senhora da Conceição), o antigo seminário, os paços do concelho e o solar Patrício Lino Netto, construído no século XVII por uma das mais importantes famílias da terra. Nas redondezas também vale a pena conhecer o miradouro (por detrás da igreja matriz), a igreja da Misericórdia e a Casa da Torre, uma curiosa construção com azulejos verdes e influências Arte Nova. Ali ao lado fica o pelourinho, reconstruído no século XX, evoca a concessão de foral à terra por D. Manuel, em 1519. Sim, esta pequena e discreta vila alentejana conta mais de cinco séculos de história.

Nada melhor que terminar o passeio junto à praia fluvial do Alamal (a cinco quilómetros do Gavião), uma das principias atrações turísticas da região, onde nem sequer falta um turismo rural do Inatel.

Rodeada de verde e com um extenso areal (em comparação com outras praias fluviais), está virada para o castelo de Belver que, no alto da outra margem, coroa este belo território. A tradição popular diz que serviu de casa à princesa Santa Joana (filha de Afonso V) e de prisão a Luís de Camões. Provas não há, mas a ser verdade o poeta há de ter escrito algum canto sobre tão bela paisagem. 

Nelson Jerónimo Rodrigues 2014-04- 22

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