A Costa Vicentina de bicicleta

Carlos Bernardo, autor do blogue O Meu Escritório é Lá Fora, conta-nos, na primeira pessoa, como é percorrer a Costa Vicentina em duas rodas. Ele e a bicicleta. Cerca de 150km a pedalar entre o Cercal e Sagres. Objetivo: viver este território com um percurso traçado, mas com abertura para o inesperado.

Dia 1 

Na verdade, o dia 1 começou no dia anterior, no B&B Verdemar, perto do Cercal, onde dormi e jantei antes de  começar a pedalar pela Costa Vicentina. Fui genuinamente bem recebido pelo Nuno e pela Christine, um casal encantador que conseguiu facilmente me fazer sentir em casa e é tão bom quando isso acontece. Recomendo também os petiscos do Nuno.

No dia 1 propriamente dito, foi pedalar do Cercal até São Torpes, local mais a norte do Parque Natural da Costa Vicentina e Sudoeste Alentejano. Foram cerca de 35km, distribuídos uniformemente, metade a subir (nunca mais acabava) e outra metade a descer (maravilha). Como ainda faltava um pouco para a hora de almoço, passei São Torpes e parei na Praia da Vieirinha, onde caso não fosse o tempo limitado, ainda dava para voltar ao surf. Assim, apenas deu para dois dedos de conversa com o André da Costazul (escola de surf) e trocar por uns segundos a bicicleta pela prancha só para a foto. Com a promessa de voltar com mais tempo.

Lá voltei para trás, novamente em direção a São Torpes, para almoçar no restaurante Trinca Espinhas. Impecável. Vista fabulosa para o Mar, raia alhada para comer e o melhor, a conversa com o proprietário Luis Magalhães sobre viagens, lugares e pessoas (existirá melhor assunto para um almoço!? Claro que não!).

Findo o almoço, foi tempo de seguir em direção a Porto Covo. E que estrada fabulosa liga São Torpes  a Porto Covo. Quase sempre com vista para o mar, são cerca de 10km, em que as pernas desligam as dores, nem se dá pelo tempo passar. As praias aqui são postais e quase parece que foram desenhadas.

 Porto Covo é uns dos locais mais cosmopolitas (se é que se pode chamar isso a um território que não é feito para turismo de massas) da Costa Vicentina e que atrai muita gente quando o calor chega. Espero que não ceda à tentação das massas e não perca a sua identidade e se mantenha o velho Porto Covo, aldeia piscatória da Costa Vicentina.

Continuo a pedalada, até V.N. Milfontes, com a ilha do Pessegueiro pelo meio. Iria terminar o primeiro dia em Milfontes, com dormida na Casa do Adro, bem no centro da vila. Onde fui maravilhosamente recebido pela D. Idália e sua família. Posso parecer repetitivo, mas voltei a sentir-me em casa. Apesar de a Casa do Adro ser o seu negócio, nada parece artificial, tudo parece real. Posso dizer que ficar na Casa do Adro é muito mais do que simplesmente dormir num alojamento dedicado ao turismo. É uma experiência digna de ser vivida. Não tem SPA, mas é um alojamento 5 estrelas.

Na hora de jantar, o escolhido foi o Ritual Restaurante Tapas Bar, bem perto da Casa do Adro. Muito bom. Super bem decorado. Simpáticos. Cozinha internacional, com um menu a ser uma autêntica volta ao Mundo, com o mais importante a ser conseguido, a comida ser boa (às vezes deixa-se esse pequeno grande pormenor de lado). Tártaro de Salmão e Caril de Gambas, recomendados. 

Dia 2

Começo o dia com o pequeno almoço gigante, na Casa do Adro. A despedida é sempre difícil, mas era tempo de seguir caminho. Passagem rápida nas praias a sul de Milfontes, Furnas e Almograve. O ponto alto da manhã estava marcado para a visita ao Cabo Sardão. Um farol e campo de futebol (sim, um campo de futebol! acredito que seja um dos campos com a vista mais bonita do Mundo!! Fica mesmo em cima da falésia). Uma paisagem imponente digna de filme. Eram 11h e estava um dia lindíssimo, no Cabo Sardão estava eu e mais três pessoas. Pergunto: “mas será que ninguém sabe que isto existe?”. Por um lado, o meu lado, foi óptimo, tinha o Cabo Sardão quase em exclusivo para mim.

Comecei no Cabo Sardão um trilho da Rota Vicentina (altamente recomendada, principalmente se for feita a pé), até Porto das Barcas, perto de Zambujeira do Mar. Fabuloso. Já fiz imensas viagens de bicicleta e pedalei por muito lado. Mas este trilho é seguramente um dos mais bonitos que já fiz. Sempre no topo da falésia, a descobrir praias desertas, esculpidas entre as rochas e com uma água azul/verde incrível. Quase a terminar o trilho, encontramos a Praia do Tonel, que leva o meu selo de recomendada.

Terminado o trilho, uma descida quase impossível de fazer de bicicleta (quando digo fazer de bicicleta, digo fazer de bicicleta às costas), que vai dar ao Porto das Barcas, um refúgio entre as rochas para os pescadores e seus pequenos barcos.

E foi por aí que almocei, no restaurante A Barca Tranquitanas, onde provei pela primeira vez bruxas, uma iguaria da região, muito parecida com a lagosta, mas mais pequena. Em termos de sabor, dá 10 a 0 à Lagosta. Parece que estava a comer Mar. Incrível.

Segui novamente pela Rota Vicentina, em direção a Zambujeira do Mar, na qual fiz uma paragem rápida, para a foto da praxe e segui caminho, pelas estradas do campo, até Brejão, sem antes passar também pela bonita praia do Carvalhal.

Foi em Brejão que dormi, nas Sete Quintas. Como não há duas sem três, fui recebido, como se recebe alguém da família. Nas Sete Quintas, para além de quartos e camas, encontrei cerca de 30 cavalos, tratados como reis (sem ser expert em cavalos, consegui perceber que ali são felizes). A cara das Sete Quintas é a Sandra. É destes encontros casuais que se fazem grandes viagens, mais do que locais para tirar fotos lindíssimas, são as pessoas que nos enriquecem com a partilha das suas histórias e nos fazem sentir, nem que seja por algumas horas, em casa. A Sandra não me recebeu como um simples hóspede, recebeu-me como um primo (e ainda me emprestou a sua carrinha para ir jantar! Verdade! O restaurante mais próximo ficava longe). 

Na carrinha da Sandra, fui jantar ao restaurante Azenhas do Mar, afamado restaurante da região (tive uma hora à espera de lugar), especialista em marisco e que cumpre um princípio muito bom, é bom e barato!!

Dia 3

Ligação rápida entre Brejão e Odeceixe, com visita à praia de Odeceixe, muito particular onde o rio entra no mar de uma forma muito particular. 

Segui para Aljezur. Aqui não dá para seguir pela Rota Vicentina de bicicleta, ou melhor, dá para ir, tinha era de a levar às costas, pois o piso é muito arenoso (imaginem andar de bicicleta na praia!). Aqui já estamos no Algarve e começamos a sentir clima surfista no ar. Existem mais pãos-de-forma do que outro carro qualquer, sempre carregadas de pranchas, à procura das melhores ondas.

De Aljezur segui para a Carrapateira. Simpática aldeia junto ao Mar. E lá almocei, no restaurante L-Colesterol. Um restaurante que me deu um extra (tipo filme, que compramos uma edição especial e vem um extra com mais imagens). Nas traseiras do L-Colesterol, existe uma mini-quinta, chamada Rivercane Gardens, que abastece a secção de legumes do restaurante, onde para além da qualidade, se sente no prato o amor com que é produzida. Uma vénia ao Diogo, o proprietário, que procura a diferença e a qualidade (polvo e perceves, do melhor que já comi). Recomendado.

Em seguida, ao demorado e óptimo almoço no L-Colesterol, voltei a seguir pelos caminhos da Rota Vicentina, voltei a subir à falésia e a ver praias e paisagens incríveis. Praia da Bordeira, Praia da Carrapateira, Portinho de Pesca do Forno e por fim a muito bonita, Praia do Amado. Trilho recomendado.

Terminado o trilho na Praia do Amado, voltei à Carrapateira e daí segui em direção a Vila do Bispo. De Vila do Bispo fiz a estrada para Sagres e de Sagres segui para o Cabo São Vicente, onde terminei a minha viagem pela Costa Vicentina (o local ideal para terminar em beleza).

Em jeito de conclusão, a Costa Vicentina é lugar com um romantismo muito próprio (e eu sou um romântico), tem paisagens incríveis, praias de sonho, comida de chorar por mais e sobretudo gente muito boa, cheia de vontade de receber.



O autor e o blogue

Nascido e criado em Abrantes, onde vive e nunca desejou ser de outro lugar. Apesar disso adora viajar. Viaja sobretudo de bicicleta porque diz que gosta de levar com o vento na cara. Mais do que uma foto de viagem, gosta de uma boa conversa. Partilha as suas histórias em O Meu Escritório é lá Fora desde 2013. Em 2015 foi nomeado para melhor Blog de Viagens Pessoal, no BTL Travel Blogger Awards.

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Carlos Bernardo 2015-07-27

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